O senso de medida e a noção de
proporção vêm sendo banidos pela conspiração de excessos de todos os gêneros. Exageros
de consumo, de lazer; de palavras, de atos; excessos de escândalos de todos os
tipos. Nada parece bastar, nada chega ao
suficiente, que poderia dar o alento da satisfação ou de mínima tranqüilidade.
Sobressaltados por constantes e
imprevisíveis variações de maré, vamos tocando a vida aos solavancos. Por
momentos, inebriados com a ilusão de felicidade vendida pelas propagandas de
sorridentes celebridades. Na fase do
compra-compra, devoramos a vida sofregamente, gastamos o que ainda não temos, embevecidos
com o crédito fácil do viva hoje e pague a perder de suas vistas. Quando vira a
maré chegam as duras penas da imprevidência e o caro preço das fantasias de
consumo, que custam os olhos da cara. E porque a vida vem sendo tocada assim,
refém dos apelos de consumo, a maioria das pessoas está hoje à deriva, refém da
atual crise. Pouca, pouquíssima gente tem reservas financeiras ou mesmo de
crédito para se amparar por algum período, ainda que seja o curso de apenas
alguns dias. A lufa-lufa do salve-se quem puder está instaurada e a agonia por
sobrevivência está espalhada por todos os cantos. Por ora, é preciso socorrer a
quem mais precise, ajudar a quem possamos, mas além disto, parece importante fazer
do presente caos uma oportunidade de reflexão e aprendizado.
Um ponto pacífico e, penso eu, de
consenso: não dá para confiar em políticos e suas políticas. Eles nos
apresentam o paraíso apenas nas milionárias campanhas. Eleitos, tiram o manto
da bondade e se revestem de incompetência, tirania e arrogância. Renovar o
plantel político com gente de melhor quilate é possível, mas vai demandar
tempo. A revolução que podemos produzir, de modo mais seguro e imediato, é a
revolução interna, pessoal.
Precisamos balizar esse mar de insolvência
para vencer a deriva, governada pelo capricho dos ventos e das tempestades. Sair
do círculo vicioso das necessidades inventadas para o círculo virtuoso de uma
vida auto-sustentável é um caminho seguro e possível. Para isso não é preciso
recorrer à complexa orientação de caros especialistas e nem fazer um curso on-line,
apenas pensar, refletir e decidir orientar a própria existência para uma vida
mais simples.
Podemos viver com menos e ser mais felizes
assim. Para isso, não há receitas mágicas, mas critérios básicos a serem
definidos de acordo com a característica de cada pessoa. Essa é a base da corrente
de pensamento crítico e consumo consciente chamada de suficientismo, defendida
por pessoas que cansaram de comprar o que não precisavam com o dinheiro que não
possuíam. A atitude de buscar e viver apenas com o suficiente rompe com os
costumes vigentes e livra a existência dos grilhões das idéias de êxito,
sucesso, luxo, popularidade e outras tantas frivolidades. A vida fica mais
leve, tranqüila e, por conseqüência, feliz.
Dispensadas todas as ansiedades desnecessárias, vivendo apenas com o
suficiente conseguimos saborear cada hora e cada dia como quem sorve a taça de preciosa
bebida. Afinal, a gente leva da vida a vida que a gente leva, como canta Leila
Pinheiro, e para isso o suficiente é o bastante, nada aquém e nada além disto.
(Publicado no Jornal Agora - em 05/09/2015)
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