Outra vez nos chega, de presente, container de lixo vindo do outro continente. Países que nos consideram de categoria inferior, que impõem barreiras alfandegárias severas a nossa gente, remetem seu lixo sorrateira e criminosamente. Comportam-se como aqueles vizinhos selvagens, que jogam dejetos para o quintal do lado imaginando que moscas, mosquitos e ratos respeitarão o muro de suas casas. O caso acontecido nesta semana, reprise de filme visto recentemente, resulta do encontro de inescrupulosos de vários países. Espertamente, fizeram uma negociação na qual todos venderam: uns venderam o lixo, outros venderam o transporte e outros venderam o lugar em que vivem e todos venderam sua almas por um negócio realmente muito sujo. Por ganância, para ter lucro fácil e rápido, intoxicaram um pouco mais nosso já sofrido meio ambiente. Mais grave do que a reincidência do achado é a desconfiança de que o descarte internacional venha acontecendo há largo tempo e só raramente seja detectado, tornando o negócio menos arriscado e ainda mais lucrativo.
Pensam que há vários planetas? Que mandando para o outro lado do oceano, o lixo desaparecerá e o problema ficará resolvido? O que precisa acontecer para que se desfaçam as ilusões nacionalistas e que o mundo todo assuma o compromisso de preservação ambiental? Quanta incapacidade de ver a Terra como a casa de todos. Os sinais claros e dramáticos da mudança climática em andamento parecem não ser suficientes para despertar a consciência planetária.
Por todos os cantos pulsam transformações agudas: maremotos, enchentes, grandes incêndios, temperaturas chegando a extremos de frio e de calor em vários países. Oceanos bombardeados por resíduos vão levando a extinção da flora e fauna ali existentes. Migrações de populações por questões ambientais vão se tornando freqüentes. Tudo filmado, fotografado, documentado para os olhos que queiram ver. Os excessos do consumo, que continuam sendo cega e irresponsavelmente estimulados, associados à total ausência de comprometimento com ações responsáveis de cuidado ao meio ambiente antecipam e agravam tragédias. O lixo mais do que compõe o cenário, é questão vital, envolve a saúde das pessoas e a sobrevivência do planeta. Deveria ser pauta preferencial dos agentes públicos, jamais poderia fazer parte de negociações meramente comerciais ou de financiamentos políticos partidários. É sério demais para ser trocado por patrocínio, tornado refém de interesses especulativos e financeiros.
Um impressionante vídeo da Discovery demonstra a estrutura do planeta e compara: se a Terra fosse uma laranja, nós ocuparíamos apenas a casca. Abaixo da sutil faixa que ocupamos, o resto são camadas insondáveis, tal sua densidade e temperatura. Essa casquinha de laranja é todo o ecossistema que nos permite viver e que está sendo duramente castigado. Por isso, que ninguém pretenda sacudir os ombros ou lavar suas mãos. O problema é nosso e temos que encará-lo: que se investigue profundamente o tráfico de lixo e que se puna de modo exemplar, tornando-o um péssimo negócio.
Publicada Caderno Mulher
21/08/2010
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