domingo, 12 de dezembro de 2010

Decidi Ignorar

Desde que passei a ignorar as novidades que todos os dias surgem, começaram a se acumular objetos, tecnologias e até palavras que não sei para que se prestam ou o que significam. E, para piorar ou melhorar, isso está me parecendo ótimo: não preciso delas, não existem para mim e quero, desejo firmemente, que continuem a não existir. As ignoro sabendo o que estou fazendo. Ignoro porque decidir ignorar, numa decisão do tipo bem pensada. Pensei , pensei, refleti, pesei, medi e conclui: não vou tomar seu conhecimento.


Eu, que era do tipo de vanguarda tecnológica, que usava agenda eletrônica e aderi aos primeiros computadores, enfrentando o trabalho de decifrar os enigmas do ambiente Dos em inglês; eu que queria tudo saber. Pois agora que tudo ficou tão amigável, que a navegação é tão colorida, rápida e ampla, cansei. Acho que foi efeito de overdose: é coisa demais, novidade demais e minha limitada capacidade de absorção foi ultrapassada. Cheguei ao meu limite.

A tecnologia Bluetooth representou o divisor de águas: nunca a utilizei. Ela está ali no celular, no computador; mas eu nunca usei e nem falta senti. Foi o primeiro sinal. Depois vieram as redes sociais e veio o Twitter. E eu até que tentei: entrei, mas nem sei se entendi. O que captei é que é um modo instantâneo de enviar mensagens curtas. Não vi o motivo da pressa – de tudo ter que ser imediato, nem de haver sentido em enviar mensagens reduzidas, incompletas para milhões de pessoas mundo afora. Ali, dei um passo mais largo no caminho para me tornar ignorante e desde então, a cada dia ignoro mais.

Talvez pareça acomodada preguiça essa resistência à atualização, mas talvez represente uma sensata dose de sanidade; uma atitude de lucidez, que me faz perceber a necessidade de fazer escolhas.

Ou adentro nos twiters e facebooks, mergulhando no mundo virtual de um milhão de amigos, ou dou atenção ao restrito grupo dos que fazem parte de minha história e do cotidiano que me cerca. Ou venço a pilha de livros que escolhi ler, saboreando palavras e refletindo sobre suas mensagens; ou dispenso minhas preciosas horas incluindo comentários incompletos em voláteis e fragmentados diálogos virtuais. Ou uma coisa ou outra: não dá para fazer tudo – pelo menos eu não consigo. Ou vivo a vida real, vivencio a minha história; ou mergulho no infinito espaço virtual.

Decidi ficar de fora. Não sei, não quero saber, mas não tenho raiva de quem saiba. Até admiro as pessoas que conseguem circular no ambiente virtual e no real, numa mesma vida. É uma admiração sem inveja, sem desejo de se seguir seu exemplo. É do tipo de admiração que tenho por quem é capaz de praticar alpinismo ou pára-quedismo. Meu espaço aéreo é mais limitado: ultraleve e asa delta são meus limites de máxima altitude.

Prefiro buscar conhecimento na sabedoria antiga a ser amarrada por novas tecnologias. E, por fim, confesso ter certo medo do avanço da dependência tecnológica. Talvez faça parte da conspiração chinesa: em breve estarão todos dependentes, com suas vidas gravadas em instáveis chips ou na invisível rede virtual.

Não tenho mais tempo para perder: o que me resta será todo dedicado inteiramente à realidade verdadeira, mesmo que isto me custe cultivar grandes áreas de ignorância.
Publicada em 12/11/2010

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