Dizem muitos que a vingança é um prato que se come frio, saboreado ardilosamente. Coisa para ser feita ao longo do tempo, marinada pela mágoa e arrematada pelo ressentimento. Fazem a cobrança tardia de coisas que não permitiram que o tempo apagasse. Vingativos convictos são esses seres capazes de dormirem muitas noites e acordarem com mesma idéia e disposição na cabeça. Esses tipos persistentes, ardilosos, que passam anos a fio bordando e tecendo reações não são numerosos, para nossa grande sorte.
A maior parte do universo dos vingativos é composta das pessoas vingativas que são dadas a reações imediatas, atos menos pensados, pouco elaborados. São os que agem no calor das emoções, com a cabeça quente, ao estilo “bateu levou”, tão em voga em situações cotidianas bem banais. Gente que não parece perdoar nada, que revida qualquer coisa que lhe pareça ter sido ofensiva: não levam desaforo para casa. É para eles uma catarse: explodem, revidam e se despojam de sua ira. Devoram o prato da vingança cru e quente. Quando a cabeça esfria e o coração se acalma conseguem refletir e até se arrepender dos atos cometidos.
Desejos de vingança pessoais fazem parte das falhas humanas e, quando causados por amores feridos ou não correspondidos, são fáceis de entender. Muita gente que procura psicoterapia (ou deveria procurar) sofre desses sentimentos mal resolvidos e só supera seus problemas quando conseguem se desfazer da ladainha da vingança que enreda sua vida ao novelo de situações passadas. Perigosas e bem mais graves são as vinganças que se transformam em atos e mais graves ainda quando ensejadas de forma coletiva, promovidas por nações.
As ações vingativas não colaboram para a paz. Não é revidando ofensas ou praticando crimes que se constrói um mundo melhor. A barbárie nunca foi companheira do entendimento e da fraternidade. Essas ações que vem de longe (e de cima) parecem distantes, mas reforçam outras formas de agir e pensar, nas quais o revide se torna legítimo. São um péssimo modelo e um mau sinal. Estaremos coletivamente aceitando a violência, a arbitrariedade e a vingança como formas legítimas de justiça? Se assim for, estamos retornando ao tempo da barbárie, do olho por olho, dente por dente; do lavar a honra com sangue e outras coisas do gênero.
Vingança é um prato indigesto e venenoso. Carregado das toxinas da raiva, dos venenos das emoções negativas, não combina bem com a vida e com o caminho do bem, embora continue sendo oferecido em variadas formas no self-service de nossa existência. O mundo estará melhor quando desarmar corações, pensamentos e atitudes; quando for alimentado por uma dieta leve, regada a fraternidade ampla, geral e irrestrita. Por enquanto, continuamos muito longe disto.
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