Poucas coisas são tão traiçoeiras como os entusiasmos: eles detonam poderosos estímulos orgânicos, mexem com a sofisticada química cerebral; atiçam vontades, cegam, ensurdecem, emudecem, entorpecem... Importa pouco o motivo que detona a elétrica tempestade, o impulso das paixões é avassalador. O excesso de entusiasmo provoca um abalo sísmico no corpo todo, deixando o coração aos pulos, a respiração ofegante, o cérebro atrapalhado e o pensamento confuso.
A intensidade do bombardeio emocional absorve e domina todos os sentidos, por isto a expressão que mais se ajusta a seus efeitos é a palavra avassaladora: que avassala, faz da pessoa um vassalo, um servo. Sob efeito de forte emoção, se pode ir do ridículo ao cometimento de desvarios e até a prática de crimes.
A provisória loucura pode ser provocada por um amor que se revele grande, capaz de sobreviver à avidez dos impulsos; mas também pode ser detonada por coisa qualquer: um objeto que se deseje comprar, um negócio que se deseja concluir, um jogo de futebol, a disputa de um campeonato. E lá se vai fora toda a razão, com sua capacidade de pesar, medir e ponderar. Perde-se o raciocínio, deixa-se de lado a inteligência. O cérebro fica aprisionado, torna-se presa das emoções quando está sob efeito da química da paixão, com febre de entusiasmo.
No caso do futebol, quando se observa as ruidosas manifestações de torcedores – cada vez mais barulhentos – dá para perceber que o ruído incentiva ainda mais a tensão e exalta os ânimos, retroalimentando o processo. Pessoas normalmente pacatas podem se alterar completamente, demonstrando excitação que lhes seja incomum. Há uma sensação de prazer em desfrutar tanta euforia, soltar gritos que avançam quarteirões e riscar o céu com rojões. O extravasar explosivo das emoções resulta para uns em descarga da tensão, mas para muitos apenas reforça o processo, deixando a pessoa ainda mais entusiasmada. Os riscos deste tipo de excesso relativamente à Copa do Mundo já foi alvo de pesquisas médicas na Alemanha e agora está sendo estudado no Brasil, em vários hospitais, para avaliar a hipótese de aumento de urgências cardiológicas. Talvez em breve o Ministério da Saúde precise lançar uma advertência semelhante à existente para cigarros e bebidas, alertando: evite o excesso de entusiasmos em sua torcida, proteja seu coração.
Como a aceleração cardíaca limita a capacidade de raciocínio, acarreta também um efeito semelhante ao da embriaguez. Pode-se falar de uma embriaguez sem álcool, que compromete a capacidade de dirigir, por isto se vê tantos excessos ao volante ao final de jogos de futebol.
Acima dos riscos imediatos citados, o mais importante pode ser refletir se controlamos nossas emoções ou se são elas que nos controlam? Seremos vassalos ou senhores de nossos entusiasmos?
Nota final: convido os leitores a visitarem a página http://www.riograndeteosofia.com/. Ali encontrarão textos de filosofia clássica e de teosofia.
publicada Jornal Agora - Caderno Mulher
26jun2010
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