domingo, 12 de dezembro de 2010

O Povo, a Virtude e o Voto

“Povo que não te virtude, acaba por ser escravo”*

Saber ler e escrever são as exigências legais mínimas para ser candidato a cargos públicos eletivos, mas este critério está longe de ser condição suficiente para desempenhar atribuições de importância maior como as funções de legislar, gerenciar o bem coletivo, tomar decisões complexas. É preciso muito mais.

Em termos cognitivos, as funções públicas eletivas exigem um nível intelectual suficiente para entender não somente as leis, mas os complexos meandros das macro-negociações. Para tomar decisões corretas e sensatas há que se ter condição mental para discernir, para avaliar, para refletir, raciocinar. Esta é uma parte da questão, mas talvez nem seja a mais grave já que os grandes desmandos têm sido praticados por pessoas que denotam boa capacidade intelectual . Por incrível que a muitos pareça, mesmo uma pessoa com limitação intelectual é capaz de entender a diferença entre o bem e o mal, entre o honesto e o desonesto, entre o justo e o injusto. São noções morais que ocupam uma área cerebral diferente das noções cognitivas do conhecimento formal (escolar, acadêmico).

Embora seja plausível escolher os mais capazes, mais inteligentes e mais cultos – já que desempenharão funções de alta relevância, o que mais se precisa (e se tem falta) são de candidatos éticos. Pessoas que tenham índole resistente às tentações do poder; que por seu passado ou por seus traços demonstrem a capacidade de negociar, sem cair em conchavos; lidar com poder, sem escorregar na ganância; manter o espírito e o interesse público, acima de seus interesses pessoais e até mesmo dos restritos interesses partidários. Pessoas com autonomia de pensar e agir: capazes de se manterem fiéis aos seus compromissos, mesmo quando sob pressão. É por ai que a escolha se torna cada vez mais difícil.

Pode parecer fora da realidade, mas existem – ainda existem – os bem intencionados, os honestos, os humildes, os autênticos, embora seja difícil achá-los no baile de fantasia que se tornou o período eleitoral. Diante de tanta propaganda e dos efeitos maquiadores da publicidade, ficou complicada a tarefa de separar o joio do trigo. Aliás, exatamente como no cultivo, os terrenos arados pelo poder são mais férteis ao joio do que ao trigo. E, como toda erva daninha, o joio não exige cuidado para ser semeado, cresce rápido e é muito resistente. Ai está bem figurado o cenário político atual: os campos estão minados de joio e os grãos de trigo sobreviventes precisam ser protegidos para que não se contaminem e envenenem. É preciso ter um paciente e cuidadoso trabalho para separar o joio dos falsos discursos do valioso trigo das boas intenções e da índole honesta.

Já que temos o poder de escolher, porque optar pelos piores? Para fazer graça? Se assim agirmos estaremos assinando nossa desgraça e confirmando nosso constante papel de bobos da abusada corte que desde os mais remotos tempos do império continua orbitando nos palácios governamentais. Na diversificada lista de candidatos há os que inspiram esperança de possuírem maiores virtudes e são esses que merecem a aposta de nosso voto. Que os eleitos deixem de refletir mazelas nacionais e passem a retratar as virtudes e glórias de nosso povo.

*Hino Rio-grandense, letra de Francisco Pinto da Fontoura

Publicada
em 02/10/2010

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