Perdi a conta do tempo em que
tudo ou quase tudo que se comprava trazia um “made in Brazil” ou a impressão do
selo de origem, indicando cidade e estado brasileiro. A vida como me lembro na
infância era assim, nacionalista. Coisas estrangeiras eram poucas e restritas
às classes de maior poder aquisitivo. Até que surgiram as calças Levis, americanas,
um dos primeiros produtos importados de grande sucesso e consumo de massa. As
Levis eram muito disputadas e para comprá-las se recorria a um comércio
informal, estilo contrabando. Esse e
alguns outros poucos produtos importados, como perfumes, eram oferecidos por
pessoas confiáveis, como uma vizinha de porta ou o conhecido carteiro da zona
onde morávamos. Como os traziam era mistério
jamais decifrado por minha mente então juvenil, que, aliás, nem pensava sobre
esse assunto. Mas isto é passado.
Fomos sendo tragados pela
globalização e pelo mundo do livre comércio dominado pela comunista China, numa
das grandes ironias desta época. Qualquer coisa que se compre traz o selo
chinês, cuja qualidade costuma ser bem duvidosa, para não falar coisa pior. Talvez
para disfarçar essa origem, freqüentemente vêm inscritas apenas as iniciais
“RPC”, em letras bem pequenas, num lugar de difícil localização. Agora, porém,
com a meteórica suba do dólar, a dominação chinesa está ameaçada e, quem sabe,
possa se aproveitar a oportunidade para resgatar a sofrida produção nacional.
Os governos não parecem estar planejando nada a respeito. Na verdade, eles
nunca parecem estar planejando. Como fazer planos se vivem assoberbados com
outros esquemas do jogo político? Quem precisa e deve fazer planos somos nós, o
heterogêneo eleitorado, que de alto a baixo da escala social sofre os desvarios
da política econômica.
De minha parte, está alinhavado o
plano e traçadas as linhas estratégicas de ação: vou dar prioridade a tudo o
que seja brasileiro e, mais do que isto, tentarei adquirir o que precise em
comércio local, resistindo o tanto quanto possa às seduções das compras
virtuais. A primeira coisa a observar, em qualquer escolha, será a origem do
produto. Como as marcas são globalizadas será preciso buscar a etiqueta ou o
registro de origem, pois o que antes era feito por aqui, agora pode ser apenas
montado ou embalado, enganando facilmente o consumidor distraído. Quando se olha
este detalhe, é de se espantar. Todo tipo de coisa está sendo trazida de fora:
de alimentos a eletrodomésticos simples. Alguns itens, como brinquedos, por
exemplo, são bem difíceis de serem encontrados nacionais, tal a hegemonia da
dominação chinesa.
Não me importarão, porém, as
dificuldades: o plano do meu governo está feito. Vou tentar governar minha
existência, apesar de todos os pesares. Darei minha minúscula quota de
sacrifício para fortalecer a desvalida indústria nacional, para ajudar a manter
os comércios locais e o emprego das tantas pessoas que nele trabalham.
Disponho-me até a pagar um pouco a mais, como sacrifício pessoal pelo bem
coletivo, muito maior e mais valioso do que meus míseros trocados e minha
insignificante individualidade. Vou pensar sempre mais longe, refletir sobre a
conseqüência de cada uma de minhas escolhas imediatas. Não vou levantar
bandeiras, nem propor revolução. Já passei, em muito desta idade. Vou apenas
exercer meu modesto direito de governar minhas escolhas. Só e apenas isto.
(publicado no Jornal Agora - em 17/10/2015)
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