Estive na terça-feira passada na
feira de agricultura orgânica, ali ao lado do Mercado Público Municipal. Meia
dúzia de bancas dividia o pequeno lugar, cercadas por uns tantos interessados.
Era a inauguração de um novo espaço, verdadeiro oásis oferecendo a oportunidade
de se encontrar alimento realmente saudável em nossa cidade. Comparada à
fantástica feira da Redenção, em Porto Alegre, poderia parecer pouco, mas
soaria assim apenas a olhos pouco observadores. A iniciativa é emblemática, representa
uma grande esperança para quem busca uma vida plenamente saudável e saiba que o
corpo é feito exclusivamente do que é alimentado. Chega num momento em que são
divulgadas notícias ainda mais assustadoras sobre a quantidade e a toxicidade
dos agrotóxicos que estão sendo aplicados nas lavouras e, por conseqüência, chegando
a nossas mesas.
Legumes, verduras, mudas, ervas
de chá e sementes são oferecidas na feira orgânica por gente de ânimo sereno e
aparência feliz. Há um orgulho singelo, mas profundo, nas pessoas que conseguem
resistir aos apelos da produção em grande escala, fugir das sementes
transgênicas, dos adubos químicos e dos agrotóxicos. O orgulho desse produtor não tem peito
estofado e nem olho gordo nos lucros. É um sentimento simples e genuíno, semelhante
ao que se tem com os próprios filhos. As
“crias” da agricultura orgânica não tem a formosura e nem as dimensões dos
frutos geneticamente modificados, feitos para impressionarem pela boa cara e
grande tamanho. O que importa na agricultura
orgânica é produzir um alimento isento de ameaças químicas e de transmutações
genéticas, apenas isto.
As bancas encantam pelos produtos
e pelo simpático atendimento. A mais preciosa para mim foi a que apresentava as
sementes crioulas, que não estavam à venda, mas alimentavam a alma com
verdadeira aula sobre o assunto. Ali estavam variadas e pouco conhecidas espécies de sementes
de abóboras, milhos e feijões. Variedades quase extintas que estão sendo
recuperadas pelos guardiões de sementes, pessoas que tem a nobre tarefa de
preservar e redistribuir espécies cada vez mais raras. Que valiosas são essas
pessoas capazes de devotarem a vida a salvar de extinção alimentos,
desenvolvendo sua tarefa no anonimato, sem receber para isto paga, incentivo ou
reconhecimento. Fazem pelo valor que dão ao patrimônio genético das sementes,
independente da indiferença que a maioria das pessoas atribua ao assunto. Silenciosa e pacientemente, garimpam
exemplares de sementes raras, catalogam, guardam protegidamente, formando um
precioso banco de sementes. Depois redistribuem a produtores realmente
interessados e comprometidos em semear as preciosas sementes crioulas. Fazem
isto através do sistema de trocas, fortalecendo a diversidade genética das
espécies locais. São exemplos de devoção ao trabalho, de amor à natureza e à
humanidade. Parecem pertencer a um universo paralelo no qual continua
prevalecendo o que realmente é mais importante.
Num mundo balizado pela ganância,
pela ostentação econômica, pela insaciável fome de lucro, os guardiões de
sementes são verdadeiros anjos da guarda da agricultura livre, sustentável e
autônoma. Mereceriam ser chamados de Guardiões da Humanidade e reverenciados
como tal.
(publicada Jornal Agora -em 27/06/2015)
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