Você deve estar estranhando minha
carta, tão acostumado que está a receber as mensagens de gente miúda. Pois
decidi vencer a inibição diante das tristes atuais circunstâncias. A coisa por
aqui, no universo das pessoas grandes, anda bem cruel, meu bom velhinho. Por
isso, após acender velas para todos os santos, pensei que não deveria
desperdiçar a oportunidade de lhe fazer um pedido.
Antes preciso confessar que há
tempos deixei de acreditar na sua pessoa e até mesmo andei censurando a
excessiva importância dada a sua figura. O nascimento de Jesus me parecia o
suficiente para fazer do Natal uma data significante.
Apesar de minha descrença e dos
conceitos que continuo tendo, resolvi registrar meu pedido. Na verdade, nada
pedirei especificamente para mim. Com o avanço dos anos e do branco de meus
cabelos, necessito de cada vez menos coisas. As materialidades da vida perderam
o poder de me encantar. Hoje o que preciso e mais desejo não se empacota, não se
precisa carregar e nem pode ser pago em moeda de qualquer espécie. Por não se
poder comprar e nem pagar, bem sei, é um pedido complicado de ser atendido. É
que estou cansada de tantos desmandos, dos desatinos generalizados; farta dos
bilhões desviados por todos os lados, dos escândalos diários, das maldades
escabrosas. Por isso venho lhe pedir um presente coletivo.
Sei que não posso pedir para que
faça acabar a fome ou a miséria no mundo. Se desse, eu até pediria, mas não me
convém exagerar. Também não valeria pedir o derradeiro final das guerras, outro
presente que eu gostaria muito de ganhar, mas seria abusar demais de sua boa
vontade. Porém, quem sabe, o senhor poderia fazer um esforço, convocar o
aniversariante Jesus e, numa grande força tarefa, realizar algum de meus
preciosos sonhos de Natal. Algo do tipo: aproveitar o brilho natalino e lançar um
tantinho de luz sobre as tantas mentes entorpecidas pela vaidade, pela
ganância, pelo egoísmo. Ou iluminasse a consciências desses muitos que nos
estão a roubar, para que voltassem a sentir vergonha, arrependimento e desejassem
devolver o que não lhes pertence. Isso seria um presentão.
Quem sabe fosse possível, nem que
só por um dia, promover o verdadeiro sentimento de solidariedade entre todas as
pessoas, acima de toda e qualquer diferença. Ou então, como numa epidemia de
febre súbita, todos se sentissem impelidos a praticarem o bem, a serem mais
generosos, compreensivos, tolerantes. Só por um dia, um diazinho apenas, um
surto de bondade inundaria todos os quadrantes do planeta. Por escassas 24
horas surgiria uma onda de fraterno amor e genuíno entendimento entre as
pessoas. Haveria uma trégua nas maldades, nas miudezas cotidianas. Ou, num
pedido mais modesto, que apenas se desse uma pausa nos afazeres, nos
compromissos e nos passatempos e se priorizasse o que realmente é importante.
Que as pessoas se olhassem e se ouvissem mutuamente.
Por fim, Papai Noel, se não der
para trazer nenhum desses presentes, pelo menos lhe peço que nos poupe das
amarguras da vida, ao menos por um dia. Já será um doce presente, que com
esperança desde já lhe agradeço.
(publicada Jornal Agora - 13/12/2014)
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