Mal
digerido o Natal e em escassos dias chega o 31 de dezembro. Final de mais um
ano e chegada de outro, novinho nas folhinhas, nos calendários, nas agendas. É o final de um pequeno ciclo da existência,
de um trecho do caminho da vida. Pode parecer bobagem, um dia igual a todos os
outros, assim diz muita gente. De fato, tirando seu significado, retirando da
noite do dia 31 de dezembro o simbolismo, restará apenas a passagem de mais um
dia. Outra forma de exterminar o simbolismo da data é tomar um chá de
esquecimento da vida e imaginar que tudo é e sempre será só festa. Mergulhando
nos excessos festivos se acaba com a possibilidade de reflexões.
Para os
supersticiosos é preciso ter cuidado com os pequenos detalhes, que teriam o poder de afastarem azares e ainda trazerem boa
sorte. Peru de Natal no final do ano? Nem pensar! O pobre bicho nos colocaria o
próximo ano todo a andar para trás. Coitado do Peru, além de geneticamente
modificado e sacrificado, ainda leva as culpas pelos atrasos da existência. E
as roupas brancas, o brinde a beira da praia, os sete
pulinhos? Esses e outros tantos rituais servem para tentar tornar mais marcante
o momento em que os ponteiros se encontram ao alto do relógio, no último dia do
ano, quando explodem os fogos de artifício. Ah, os fogos! De uns tempos para cá passaram a ser medidos
em toneladas cada vez maiores e mais demoradas foram ficando as explosões. É o
excesso dos excessos, bem ajustado a essa época de overdoses e ostentações
generalizadas. Tudo pelas aparências, assim ditam os mais exóticos formadores
de opinião aos seus súditos seguidores-copiadores. Se o festival de excessos
continua sendo sucesso de público o ano todo, como o Réveillon poderia seria
diferente?
Esse ano,
por certo, teremos todos que enfrentar ou “curtir” o Réveillon, com suas
exageradas celebrações e as tragédias de sempre. Ainda não avançamos o
suficiente. Nossos paradigmas continuam os mesmos, cheios de equívocos e
contradições. Cada vez mais opulência e luxo, ladeada por miséria e
desigualdade. E o Ano Novo não dá sinal
algum de que possa nos trazer a benção de grandes transformações, por mais
otimistas que sejamos. Resta-nos torcer por pequenos avanços, fazer o melhor
possível a nossa parte e acreditar que – ao longo do tempo – chegaremos a um
mundo realmente melhor.
A vida é transitória, fugaz, e o final de cada
ano apenas faz um registro simbólico do quanto é rápida a passagem do tempo. Reforçando
esse sentido, lembrei de registrar aqui um pensamento da sabedoria oriental que
ouvi inúmeras vezes na minha infância e que – talvez por isso – ficou gravado
na minha memória e fez vinco em minha personalidade. São palavras
transformadoras, se levadas como lema de vida. Encerro essa última crônica do
ano celebrando a chegada do novo ano com esse pensamento inspirador, como fazia
minha mãe, ao terminar seus programas na Rádio Riograndina:
“Só passarei por este mundo uma vez. Assim, todas as boas ações que
possa praticar e todas as gentilezas que eu possa dispensar a qualquer ser
humano, devo aproveitar este momento e fazê-lo. Não devo adiá-las, nem
esquecer-me delas, pois não voltarei a passar por este caminho.”
(Publicada Jornal Agora - 27/12/2014)
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