Charmosa, rodeada de águas e belezas ainda não descobertas, a Noiva do Mar se viu, há tempos distantes, abandonada pelo noivo Passado. Nunca se soubera bem se ele, senhor de todas as indústrias, entrara em falência ou fugira para contrair núpcias em terras distantes. Por certo ficou apenas o total abandono em que deixara sua prometida. Ela, noiva abandonada no altar, se recolheu no mais profundo desgosto. Ficou difamada por ter sido preterida e por décadas viveu buscando refugio na lembrança dos bons tempos do romance. Relembrava o prazer de ir ao Cinema Gloria, das tardes de domingo passeando de bonde, do sabor dos doces na Confeitaria Sol de Ouro, dos passeios ao Jockey Club e de toda a aura de encantos e de riquezas de então. Chegava a sorrir com a alegria da felicidade trazida pelas boas lembranças.
Infelizmente, para sua maior infelicidade, o sabor doce das reminiscências se espairecia rapidamente na nuvem escura das más recordações, envolvendo-a em doloroso ressentimento pelas ilusões perdidas com Passado. Era quando via, como se diante de seus olhos estivessem, as fábricas despejando desempregados por seus portões, os bons comércios encerrando atividades. Como num filme, lhe surgia a imagem da cidade toda se encolhendo no mais doloroso dos lutos. À sua volta, o disse me disse no circular das maledicências reforçava ainda mais o amargo sentimento de desesperança. “Deve ser praga”, diziam os crentes, imaginando uma força maligna que se instaurara. Alguns até testemunhavam terem visto uma caveira que fora enterrada causando tamanha desgraça. Outros, mais céticos, encontravam explicações diferentes para o eterno abandono. Só uns poucos conseguiam se manter otimistas e acreditavam que alguma coisa boa pudesse reverter tamanha infelicidade. Esses eram considerados lunáticos sonhadores.
Eis que surge uma inesperada novidade: um rico pretendente da Noiva do Mar estaria para chegar e viria de longe. O coro dos descrentes graceja da novidade, não acredita que Futuro, o pretendente anunciado, possa ser verdadeiro. “Isso é invenção”. “Deve ser mais um aventureiro”, comentavam, lembrando de alguns pretendentes que haviam surgido tempos atrás, anunciando mundos e fundos, e depois sumindo sem deixarem mínimo vestígio de sua passagem. Desdenhando dos que não acreditavam na possibilidade de um novo romance, eis que se apresenta Futuro. Cheio de propostas e revestido das melhores intenções, se apressa em apresentar à noiva uma aliança de compromisso. Dispõe-se a colocar seus tesouros fixados na terra, penhorando-os como prova de que não está de passagem, de que veio para ficar e seu amor será duradouro.
Como se não quisesse perder a noiva, se apressa em trocar alianças, fazendo de tudo para tornar o compromisso mais sólido. A boca pequena, os descrentes ainda tentam desqualificar o pretendente. Não lhes sendo mais possível negar Futuro, agora de corpo presente, resolvem ficar difamando o noivo: “não deve ser tão bom”, “ninguém é perfeito”, “era muito melhor como estava antes”. E assim, continua girando a roda dos comentários negativos. Mas a noiva, amadurecida pelas experiências penosas que passara, está disposta a apostar todas as fichas que lhe restaram em Futuro, um pretende audacioso, guarnecido de boas atitudes e acompanhado de ótimas referencias. Sabe que a lua de mel não será eterna, pois nada é, mas que serão felizes enquanto estiverem juntos. E assim seguem de mãos dadas a Noiva do Mar e o Futuro, distribuindo sorrisos e iluminando de esperanças as ruas da cidade.
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